sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Kantor

TEATRO HAPPENING (1967)

Fazer surgir suas possibilidades e atividades “inatas”, “primárias”, criar uma zona de “preexistência” do ator que, todavia, não está ocupada pelo universo ilusório do texto. Como diz Kantor: “Quero que a realidade que o texto reivindica não se constitua fácil e superficialmente, senão que se una indivisivelmente com essa pré-existência (pré-realidade) do ator e que o cenário esteja arraigado nele e dele surja.” O ator não representa nenhum papel, não cria nenhuma personagem, não o imita. Longe de ser a cópia ou reprodução fiel de seu papel, o ator o assume, consciente de seu destino e de sua situação.

Esse ponto de vista expressa os princípios que acender as atividades do tipo happening. “Tomo previamente a realidade, os fenômenos e os objetos mais elementares, os que constituem a “massa” e a “pasta” de nossa vida de todos os dias, me sirvo deles, jogo com eles, tiro-lhes sua função e sua finalidade, desarmo-os, deixando-os levar uma existência autônoma, dilatar-se e desenrolar-se livremente”.

Um happening de autoria de Tadeusz Kantor:
“Pequeno local escuro”
Em todo o piso estão espalhadas massas de diários. Os diários estão dependurados em cordas como roupa, desde o teto até o solo, sobre o solo, em desordem. Pilhas de diários. No meio, uma banheira de ferro. Corre água fervendo, molha os montes de diários. Ruído de água, baforadas de vapor, nuvens inteiras de vapor. Diante da mesa uma mulher gorda passa os diários molhados. Joga baldes de água – a água corre por todas as partes, baforadas de vapor.

A mulher gorda molha os diários na banheira, passa os diários, grita, soletra, abre muito a boca, sílabas, vogais, consoantes, todo o alfabeto abc... números 1,2,3,4... as notas de solfejo dó, ré, mi... grita, joga água, canta, passa, baforadas de vapor.

Um alto falante, ruído confuso, entrecortado, informações, notícias políticas, locais, esportivas, criminais, jurídicas, previsão do tempo, enterros, casamentos, nascimentos, investigações policiais, arte. Cada vez mais vapor e gritos da gorda analfabeta.

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