Afonso Gentil, especial para o Aplauso Brasil (aplausobrasil@aplausobrasil.com)
Com pouco mais de quatro anos de vida, o Redimunho de
Investigação Teatral tem se mantido coerente à trilha proposta desde o
início, a de um teatro de feições
antropológicas que reflete um pouco conhecido e pouco
explorado Brasil “profundo”. Mais especificamente da população
campesina, aquela das crendices seculares, que acabaram se incorporando a
esse mundo aparentemente prosaico, mas de profundos mistérios. Em Marulho: o Caminho do Rio, há, como nos belos A Casa e Vesperais nas Janelas,
suas duas primeiras montagens, aquele movimento surdo, quase
imperceptível, de ondas “cristalinas e permanentes” permeando a ação e
deixando as personagens em mágico estado de suspensão entre o real e o
imaginário.
No universo repaginado com raros vigor e rigor criativos, entre os
novos encenadores, por Rudifran Pompeo, primeiramente como dramaturgo e,
igualmente como diretor, com inconfundível e personalíssima visão
estética da perenidade das tradições populares, das gentes simples do
interior, Marulho capta o telúrico que emana
daqueles seres tão rudes quanto ingênuos. Por isso mesmo, tão distantes e
alheios às mazelas de nós citadinos, para sua própria felicidade.
O crítico teatral Edgar Olimpio de Souza, em sua revista eletrônica
Stravaganza se demorou, com invejável perspicácia, cena a cena, intenção
por intenção, o quanto Rudifran e sua equipe formam um todo coeso nesse
“relato de densidade poética, que transpira delicadeza em um clima
mágico e fabular”. E imune, acrescentamos agora nós, a certas assertivas
descabidas (para dizer o menos) enfileiradas em jornal de grande
prestígio, notadamente quando se demora na prosódia utilizada pelo
elenco, totalmente equivocada, segundo o articulista. Justamente aquela
prosódia que vem desde os tempos dos gregos, é mole?
O
que causa polêmica (saudável, aliás) é a inserção, entre as cenas, dos
conflitos vivenciados pelo Redimunho, durante a construção do
espetáculo, criando um clima pirandeliano pelos seus pungentes e
doloridos questionamentos do “ser ator” e do “ser ficção”, jogo muito
teatral e muito atraente quando colocado em cena, como aqui.
Ao mesmo tempo, o recurso do carteiro que adentra a cena fictícia
(real, para nós) trazendo cartas ameaçadoras para a equipe, sacode o
ritmo por si contemplativo (mas, jamais monótono) dos causos, com o
“frisson” (arrepio) das fofocas e indagações das coxias.
É tranquilizante e salutar termos em atividade um grupo como o
Redimunho. Prazer um tanto raro, em meio a tanta egolatria que grassa em
palcos bajulados pela mídia.
SERVIÇO:
MARULHO O CAMINHO DO RIO/ Espaço Redimunho à rua
Álvaro de Carvalho, 75, Centro / fone 3101-9645 /R$ 30,00 (inteira) / 12
anos / Sábados às 2l horas e aos domingos às l9h/ Duração: 140 minutos
http://aplausobrasil.org/2011/02/23/marulho-capta-com-maestria-inquietantes-misterios-campestres/#more-2958
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